Desinformação e eleições. Vamos avaliar os riscos? [#01]

Foto: Luiz Roberto/Secom/TSE

Olá, pessoas.

Luciano Bitencourt aqui.

A e-Comtextos está lançando um boletim semanal, a ser publicado inicialmente no Linkedin todas as segundas-feiras, sobre os impactos da desinformação em processos eleitorais. Não pretendemos fazer checagem nem ficar buscando “fake news” nas mídias digitais.

Nosso intuito é trazer referências que ajudem a compreender o cenário, os riscos e as implicações desse fenômeno em nossas escolhas eleitorais.

Estamos pesquisando a fundo, eu e Daniela Germann, como o ecossistema de informação tem sido afetado por estratégias de propagação de mentiras e por decisões que limitam a liberdade de expressão.

Por ser um debate difícil, nos propusemos a explorar os diferentes argumentos em torno dos limites entre o livre exercício de manifestação política e a disseminação de discursos nocivos, violentos e preconceituosos.

Este boletim é um dos produtos associados a nossas apurações a respeito da desinformação em eleições. Estamos elaborando também relatos especializados e um Observatório, a serem disponibilizados em breve.

Como jornalistas e professores, queremos ampliar o alcance do debate já encampado por muitas instituições e das informações riquíssimas acessíveis em diferentes fontes.

Também queremos mostrar a importância do que fazemos para pautar decisões e orientar ações futuras em quaisquer áreas. Visite a nossa página para entender melhor.

Feito o preâmbulo, vamos ao boletim #01.

O “X” da liberdade de expressão

Elon Musk, o bilionário dono do ex-Twitter, protagoniza uma orquestração de ataques ao judiciário brasileiro. No domingo, 07 de abril, pediu em sua conta na mídia social o impeachment ou a renúncia do ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes.

Musk alega que Moraes foi responsável por violar as leis brasileiras e promover a censura ao fazer exigências sobre a suspensão de contas de bolsonaristas e exigir abertura de dados sobre investigados por disseminar notícias falsas e atentar contra a democracia no Brasil.

Além disso, o bilionário enfatizou que não obedeceria decisões do STF e divulgaria documentos comprovando as ações autoritárias do ministro, que virou alvo de críticas por conduzir processos que supostamente ferem a liberdade de expressão.

Os primeiros registros dessa “irregularidade” surgiram na mídia de Elon Musk em uma publicação do jornalista estadunidense Michael Shellenberger, no dia 03 de abril, em postagem denominada “Twitter Files – Brazil”. A partir daí, o tema ganhou abrangência nas redes digitais, especialmente de direita.

No sábado, 06, depois das primeiras postagens de Musk reforçando a denúncia, Alexandre de Moraes incluiu o empresário no inquérito sobre milícias digitais e abriu investigação sobre a conduta dele neste episódio específico.

Esses eventos não são isolados. Allan dos Santos, cujas contas nas mídias sociais estão bloqueadas pela justiça, chegou a fazer uma live pelo próprio ex-Twitter com acusações ao ministro Moraes e dizendo que vai promover candidaturas de políticos de direita nas eleições municipais.

Os fatos aqui mostram uma estratégia do ecossistema de desinformação para desestabilizar e desacreditar instituições. Uma “autoridade”, como o jornalista estadunidense, faz publicações que reverberam primeiro em veículos alinhados ideologicamente com as denúncias, ganham força nas redes com a participação de influenciadores (aqui no caso o próprio Musk) e furam a bolha ao entrar na pauta de cobertura da imprensa.

A “poluição informacional”, como dizem os estudiosos do ramo, é bem mais tóxica.

Ao abrir Facebook, Instagram ou WhatsApp você se depara com Alexandre de Moraes vendendo serviços financeiros cujo retorno é “superior ao salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)” ou com Flávio Dino vendendo equipamentos para computadores. Dá para acreditar?

Talvez não nos anúncios. Mas, as peças “publicitárias” fazem parte dos 981 anúncios fraudulentos encontrados entre setembro de 2023 e fevereiro de 2024 por pesquisadores do Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais (NetLab) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), todos envolvendo ministros do STF (à época, Flávio Dino era ministro da Justiça).

Segundo o NetLab, 99 páginas e perfis em 13 estados brasileiros mobilizaram mais de R$ 85 mil em financiamento para promover as peças. Muitas dessas páginas e perfis mostram poucas publicações orgânicas e número pequeno de seguidores, o que caracteriza falta de autenticidade. Em bom português, falsos.

Objeto preferido das campanhas de desinformação, a Justiça Eleitoral tem se esforçado para criar normatizações e coibir comportamentos fraudulentos, especialmente neste ano em que cerca de 157 milhões de eleitores vão às urnas.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai contar com apoio jurídico e de investigação nos casos em que se verificar a disseminação de informações deliberadamente falsas ou enganosas. Um acordo foi firmado com a Polícia Federal (PF) e com a Advocacia Geral da União (AGU) como forma de agilizar processos contra fraudes durante as eleições.

Para a Justiça Eleitoral, o cenário é mais desafiador do que se supõe. O próprio Centro Integrado de Enfrentamento à Desinformação e Defesa da Democracia (CIEDDE), institucionalizado pelo TSE com a participação de entidades públicas e privadas, foi vítima de clonagem e ações fraudulentas. E nem bem começou a atuar.

Plaraformas e perfis falsos do CIEDEE em mídias sociais foram derrubados menos de uma semana depois do seu lançamento oficial. O TSE tem recebido críticas de instituições preocupadas com recentes resoluções alterando normas existentes em outros dispositivos, sob pretexto de fortalecer o combate à desinformação.

Em síntese, as plataformas ficam obrigadas a tirar de circulação conteúdos considerados prejudiciais ao processo eleitoral ou serão também responsabilizadas. As críticas dizem respeito ao risco de que a medida sirva para cercear a liberdade de expressão em casos específicos.

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