LEITURA CRÍTICA

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Enquanto o STF avalia se plataformas devem ser responsabilizadas por conteúdos ilegais sem decisão judicial prévia, o Senado pode aprovar nesta semana o projeto de lei que regula o uso de inteligências artificiais no Brasil. o Judiciário tende a apertar o cerco às plataformas e o Legislativo ameniza a responsabilização das empresas desenvolvimento de tecnologias que impactam na liberdade de expressão e na integridade da informação em meios digitais. Nesse cenário, as 'big techs' investem cada vez mais na presença direta em decisões de Estado e determinados governos promovem a judicialização de liberdades, a estigmatização da imprensa e o uso de tecnologias de vigilância como forma de controle.

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Levantamento feito pelo Aos Fatos revela que a dificuldade de interpretação e a falta de perícia nas decisões judiciais sobre o uso de Inteligência Artificial em anúncios políticos podem ser mais impactantes nas eleições deste ano do que os efeitos da propaganda enganosa. Durante a pré-campanha, algumas decisões de juízes e juízas eleitorais não corresponderam a um padrão porque o Brasil ainda não tem uma base legal estruturada para enfrentar o desafio nem exemplos de casos para sustentar as interpretações. Também não há conhecimento técnico específico para identificar as tecnologias usadas em conteúdos supostamente irregulares. Os riscos para a integridade eleitoral, neste cenário, são mais sutis. A tendência de judicialização de qualquer tipo de conteúdo considerado enganoso pode sobrecarregar a Justiça Eleitoral com decisões controversas e minar a credibilidade dos argumentos jurídicos.

Para garantir a integridade das eleições, o Tribunal Superior Eleitoral anunciou medidas que incluem convênios com grandes empresas de tecnologia, transparência das ações judiciais e o lançamento de campanhas contra mentiras na campanha. Contudo, as estratégias de marketing digital exploradas por candidatos como Pablo Marçal, em São Paulo, somadas ao papel ambíguo das 'big techs', levantam questões que não estão no escopo das propostas para enfrentar o fenômeno da desinformação. A crescente influência dos modelos de negócio das plataformas digitais e o apoio financeiro de gigantes da tecnologia em iniciativas de educação midiática e produções jornalísticas, incluindo checagem de fatos, revelam um dilema: estariam essas ações fortalecendo a Democracia ou apenas reforçando estratégias que lucram com a desinformação?

O uso da Inteligência Artificial nas eleições deste ano é tema central nas discussões sobre os impactos da desinformação. A Justiça Eleitoral implementou normas rigorosas para evitar o uso de conteúdo fabricado e, ao mesmo tempo, vai adotar ferramentas de IA para dar agilidade e eficiência no combate às 'fake news'. Como desafio, a integridade do sistema de votação e a própria atuação da Justiça Eleitoral passam pelo escrutínio de uma população vulnerável às informações falsas, mas favorável a punições severas para candidatos que se beneficiem do uso de desinformação ao longo da campanha. O dilema nesse cenário está em como garantir respostas rápidas no combate à propagação de conteúdo enganoso e justificar as decisões a um grupo significativo de eleitores incapaz de discernir entre o que é verdadeiro e o que é falso na disputa pelo voto.

Guilherme Boulos, candidato à prefeitura de São Paulo, se reuniu com a presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, para discutir a urgência da agilidade nas respostas da Justiça Eleitoral em coibir 'fake news' durante a campanha. Para ele, o repositório de jurisprudências criado pela Justiça Eleitoral para ajudar nas decisões pode ajudar nessa missão. No entanto, o "senso de urgência" enfatizado pelo candidato está deslocado. A grande oportunidade nestas eleições é a de consolidar uma jurisprudência sólida no enfrentamento à desinformação, especialmente porque o processo regionalizado deve permitir diversidade de casos concretos a serem analisados de forma descentralizada por juízes de primeira instância. Os desafios estão na dificuldade de definir objetivamente o que é desinformação, distinguindo o que expressa má-fé, e a quem cabe este papel.